segunda-feira, 2 de novembro de 2015

 SOBRE A GERAÇÃO ESPONTÂNEA

Publicado na RIE novembro de 2015


                   A Teoria da Geração Espontânea ou abiogênese é a crença na origem do ser vivo sem que este precise de pais biológicos para existir.  Por exemplo, acreditar que larvas se originariam simplesmente de carnes em putrefação ou esperar que seres vivos apareçam através da ativação da matéria inanimada. Segundo José Luis Soares, na teoria da geração espontânea: o “calor, a umidade e o lodo poderiam constituir-se em elementos fundamentais para a ativação da matéria bruta” (1), por isto, por exemplo, que Jan Baptiste van Helmont (2) ensinava a obtenção de escorpiões e ratos a partir camisolas suadas em lugares escuros e úmidos.
                   A idéia da geração espontânea pode nos parecer atualmente até ridícula, porém, foi aceita como hipótese possível da Antiguidade até o século XIX, quando o biólogo Louis Pasteur a questionou de maneira definitiva com suas experiências com o frasco de “pescoço de cisne” (3) de modo que, retirando o problema da origem dos primeiros seres vivos em épocas primordiais, sabemos que todas as criaturas vivas, inclusive as microscópicas, se originam de outras pela reprodução. Entretanto, é um erro pensarmos que logo após os experimentos de Louis Pasteur, a idéia da geração espontânea tenha desaparecido completamente da mentalidade do homem do século XIX, já que é necessário certo tempo para que as ideias novas se estabeleçam e as antigas tenham ido embora, assim, não é estranho que Allan Kardec tenha defendido a abiogênese para seres orgânicos simples (4), porém, nunca abordou o tema de forma categórica, ao contrário, tratou da questão como uma hipótese (5).
                   Sendo compreensível a opinião de Kardec sobre a geração espontânea, qual era o posicionamento dos Espíritos que trabalhavam junto ao Codificador? Iluminar este ponto é importantíssimo devido à alegação de alguns críticos que afirmam terem sido os Espíritos da Codificação a favor da Geração Espontânea, na questão 46 do Livro dos Espíritos.
                   Para compreendermos o Espiritismo é um erro analisar a questão 46 ou outra, de maneira isolada. Para sabermos o que realmente os Espíritos desejaram expressar devemos ir para além da questão 46 para depois, apenas depois, retornarmos a ela.
                   A teoria da geração espontânea pressupõe que os seres vivos, surgidos desta maneira, não tenham nenhuma relação entre si, já que não teriam nenhuma forma de parentesco, seriam independentes, pois na ausência de pais, não poderiam ser parentes. Entretanto, os Espíritos da Codificação revelam que na natureza, as espécies mais diferentes guardam relação entre si, como fica evidente neste trecho, da questão 589 do Livro dos Espíritos: “Tudo em a Natureza é transição, por isso mesmo que uma coisa não se assemelha a outra e, no entanto, todas se prendem umas às outras (6) (grifo meu). Como vemos, se tudo na natureza tem pontos de contato até as coisas mais díspares, é porque os seres vivos não nascem por geração espontânea e sim pela reprodução. Outra questão útil para se analisar é a 53 “a” do Livro dos Espíritos onde foi perguntado se os diferentes tipos de homens (7) que surgiram a milhões de anos atrás eram espécies distintas e a resposta dos Espíritos foi: “Certamente que não; todos são da mesma família. Porventura as múltiplas variedades de um mesmo fruto são motivo para que elas deixem de formar uma só espécie? e por fim a questão 49 do Livro dos Espíritos onde a ideia da reprodução é bem visível: Se o gérmen da espécie humana se encontrava entre os elementos orgânicos do globo, por que não se formam espontaneamente homens, como na origem dos tempos? R: “O princípio das coisas está nos segredos de Deus. Entretanto, pode dizer-se que os homens, uma vez espalhados pela Terra, absorveram em si mesmos os elementos necessários à sua própria formação, para os transmitir segundo as leis da reprodução. O mesmo se deu com as diferentes espécies de seres vivos” (Grifo meu). Nesta última questão é interessante notar que os espíritos não entraram em detalhes sobre o início das coisas, apenas disseram “uma vez espalhados”, nem disseram como teria sido a absorção dos elementos necessários à formação do homem, porém, como tudo na natureza tem pontos de contato, estes elementos apenas poderiam vir de outros seres vivos, ancestrais do homem e não por geração espontânea, além disso, palavras como “transição”, “todas se prendem umas às outras”, “leis da reprodução” e “família” remetem a conceitos atuais em Biologia e Genética, trazendo a Doutrina Espírita para o mundo contemporâneo o que afasta a hipótese dos Espíritos terem defendido a Teoria da Geração Espontânea.
                 Uma vez feito estas análises preliminares chegamos à questão 46 do Livro dos Espíritos: “Ainda há seres que nasçam espontaneamente? Sim, mas o gérmen primitivo já existia em estado latente. Sois todos os dias testemunhas desse fenômeno. Os tecidos do corpo humano e do dos animais não encerram os germens de uma multidão de vermes que só esperam, para desabrochar, a fermentação pútrida que lhes é necessária à existência? É um mundo minúsculo que dormita e se cria.”
                  Ao analisarmos a resposta dos espíritos, percebemos que ela não diz respeito a Teoria da Geração Espontânea.  É fácil entender isto após analisar o tipo de exemplo que os espíritos deram: vermes que desabrocham na fermentação pútrida dos cadáveres. Ora, se tudo na natureza tem pontos de contato, descartada está a Geração Espontânea permanente, então a palavra “verme” não pode se referir aos seres macroscópicos que comem os cadáveres, já que estes se originam das moscas e não estão dentro do corpo humano, aguardando a morte dos tecidos para desabrochar. As coisas que estão dentro dos órgãos são multidões de bactérias que participam do processo de putrefação, principalmente as intestinais (8) e é neste sentido que se deve entender a palavra verme.
                Observamos que os espíritos não se referem à Teoria da Geração Espontânea na questão 46 do Livro dos Espíritos, mas sim, a fenômenos de aparecimento e desenvolvimento de seres vivos sem causa exterior aparente, sem a intervenção do homem, ou que não estejamos esperando. Podemos citar outros fenômenos que se encaixam na frase: “É um mundo minúsculo que dormita e se cria” como o convívio durante anos com vírus patológicos que ficam encubados (dormindo) de forma latente, encobertos, ocultos, para se reproduzirem em certas ocasiões ocasionando doenças como a herpes. As bactérias do mesmo modo, embora possam participar de outros processos enquanto o corpo está vivo, conservam a capacidade de tomar parte da decomposição em “segredo”, as ocultas, “esperando”, o sistema imunológico ausentar-se, na ocasião da morte, para se reproduzirem (desabrocharem) livremente pelo corpo.
                 No contexto integral da reflexão que fizemos até aqui, entendemos de maneira mais clara a resposta dos espíritos sobre a possibilidade do nascimento de seres de forma espontânea: “Sim, mas o gérmen primitivo já existia em estado latente”. Ora, a resposta foi afirmativa, porém com uma condição, o germe primitivo teria que existir com antecedência, ou seja, o germe (estado rudimentar e originário de todo ser vivo, embrião) teria que já estar presente em forma latente para depois se multiplicar.  Notamos que os Espíritos não entraram em detalhes como este embrião, semente, ou germe teria aparecido, mas como vimos anteriormente, que a Doutrina Espírita não defende a Teoria da Geração Espontânea, mas justamente o contrário, defende as leis da reprodução, da descendência, da transição (evolução) e o parentesco entre as espécies, este “gérmen primitivo” apenas poderia ter se originado pela reprodução de outros seres vivos e estes de outros, assim sucessivamente até chegarmos ao tempo das primeiras eras do planeta Terra e por fim aos mistérios da Criação.


(1) Livro Biologia Básica de José Luis Soares.
(2) O Belga Jan Baptiste van Helmont foi médico, fisiologista, químico e bioquímico e grande propagador da Abiogênese do século XVII.
(3) O frasco de pescoço de cisne impede que os microorganismos do ar entrem em contato com um caldo que fica estéril após fervido. Somente se for quebrado o gargalo do frasco é que surgem microorganismos no caldo, indicando que estes se originam do exterior e não nascem espontaneamente da substancia fervida.
(4) No livro A Gênese de Allan Kardec, capítulo X em Escala dos Seres Orgânicos, item 25 está escrito: De acordo com o que fica dito, percebe-se que não exista geração espontânea senão para os seres orgânicos elementares”.
(5) No livro A Gênese de Allan Kardec, capítulo X em Geração Espontânea, item 23: No estado atual dos nossos conhecimentos, não podemos estabelecer a teoria da geração espontânea permanente, senão como hipótese, mas como hipótese provável e que um dia, talvez, tome lugar entre as verdades científicas incontestes”.
(6) Kardec indaga nesta questão se a planta carnívora (dioneia) seria uma espécie de transição entre as plantas e os animais, revelando que o assunto nesta questão era a dimensão biológica dos seres vivos e não a questão espiritual tratada em outras perguntas.
(7) Homo habilis, erectus, ergaster, heidelbergensis, floresiensis e neanderthalensis e o recentemente encontrado Homo naledi, são exemplos de ancestrais humanos cuja árvore genealógica confirma antepassados comuns.
(8) No endereço: http://gizmodo.uol.com.br/corpo-depois-morte/ encontramos informações sobres às bactérias intestinais na ocasião da morte: “De longe, a maior dessas comunidades vive no intestino, lar de trilhões de bactérias que pertencem a centenas ou milhares de espécies diferentes”, mais adiante outra passagem: “A maioria dos órgãos internos são desprovidos de micróbios quando estão vivos. Pouco depois da morte, no entanto, o sistema imunológico para de funcionar, deixando que eles se espalhem livremente por todo o corpo”, E finalmente neste outro trecho: “Uma vez que a autodigestão se inicia e a bactéria começa a escapar do trato gastrointestinal, a putrefação começa”.


Fausto Fabiano da Silva
contextoespirita.blogspot.com

BIBLIOGRAFIA

KARDEC, Allan. A Gênese. 1ed. Rio de Janeiro: Ed. León Denis, 2008.
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 67 ed. São Paulo: Ed. Lake, 2007.
SOARES, José Luis. Biologia Básica. 2 ed. São Paulo:  Ed. Scipione, 1988.
COSTANDI, Moheb. Tudo o que acontece com o corpo após a morte. Disponível em: http://gizmodo.uol.com.br/corpo-depois-morte/ . Acesso em 24 ago. 2015.






sábado, 5 de setembro de 2015

Da proibição Bíblica para quem consulte os mortos

                                                      DA PROIBIÇÃO BÍBLICA
                                             PARA QUEM CONSULTE OS MORTOS
                   
                                             (Publicado na RIE de setembro de 2015)


               Para começar a responder qualquer crítica contra o Espiritismo quando esta crítica envolve a citação de um livro considerado sagrado por uma comunidade religiosa, devemos lembrar qual é a base da autoridade da Doutrina Espírita. Primeiramente vem da razão: "ao qual cumpre se submeta, sem exceção, tudo o que venha dos Espíritos. Toda teoria em manifesta contradição com o bom-senso, com uma lógica rigorosa e com os dados positivos já adquiridos, deve ser rejeitada, por mais respeitável que seja o nome que traga como assinatura" (1). Depois, do ensino dos Espíritos, passado por certos critérios, explicados nesta frase de Kardec: Uma só garantia séria existe para o ensino dos Espíritos: a concordância que haja entre as revelações que eles façam espontaneamente, servindo-se de grande número de médiuns estranhos uns aos outros e em vários lugares (2). Portanto, criticar a Doutrina Espírita citando textos religiosos, no caso em questão a Bíblia, não faz nenhum sentido para os espíritas, pois o Espiritismo não se baseia na Bíblia e sim na razão e no Ensino dos Espíritos. Entretanto, algumas pessoas poderiam acreditar que a Doutrina Espírita se basearia na Bíblia ou teria este livro como referência, já que existe o Evangelho Segundo o Espiritismo entre os livros publicados por Kardec. Esta ideia não é correta, já que foram os Espíritos da Codificação que citaram Jesus e revelaram como verdadeira a sua moral: “Os Espíritos vêm não só confirmá-la, mas também mostrar-nos a sua utilidade prática” (3), e é por causa disto que o olhar espírita se voltou para os evangelhos, e não porque eles estavam na Bíblia. Desta maneira, compreende-se por que o terceiro livro da Codificação é o Evangelho Segundo o Espiritismo e não o Espiritismo segundo os Evangelhos, muito menos o Espiritismo segundo a Bíblia. E a reflexão exposta até aqui serve de resposta a qualquer indagação sobre divergências entre a Bíblia e o Espiritismo ou entre este e a Teologia Cristã.
               Todo espírita deve saber que a Doutrina Espírita tem vocação pela verdade, encontre-se ela onde estiver. Desta maneira, podemos citar qualquer trecho, de qualquer livro, desde que se entendam estes trechos ou capítulos como verdadeiros ou de interesse doutrinário. Caem por terra, portanto, as críticas contumazes de que o Espiritismo pegaria apenas o que lhe interessa da Bíblia e deixaria o resto. Ora, se o Espiritismo se baseasse na Bíblia e principalmente na Teologia Cristã, esta crítica teria razão de ser, mas a Doutrina Espírita se baseia na razão, no bom senso e na instrução dos Espíritos, de modo que não há nenhuma contradição em  encontrar referências evangélicas nas Obras Básicas e ao mesmo tempo afirmar o equívoco de determinadas passagens. Dentre estas últimas, tomemos por exemplo Eclesiastes 9:5, muito usada para negar a comunicação mediúnica com aqueles que já morreram: “Por que os vivos sabem que hão de morrer, mas os mortos não sabem coisa nenhuma, nem tampouco terão eles recompensa, mas a sua memória fica entregue ao esquecimento”.
                 Todo espírita também deve saber que a Doutrina Espírita não está numa posição de inferioridade em relação à Teologia Cristã, por isto os espíritas não precisam correr para dar explicações sobre esta ou aquela passagem bíblica que em tese estaria em desacordo com o Espiritismo. Ora, se as explicações existem é por um motivo mais profundo, revelado neste magnífico trecho do Evangelho Segundo o Espiritismo: “Eu vos digo, em verdade, que são chegados os tempos em que todas as coisas hão de ser restabelecidas no seu verdadeiro sentido, para dissipar as trevas, confundir os orgulhosos e glorificar os justos” (4). Por isto Kardec escreveu:“Por bem largo tempo, os homens se têm estraçalhado e anatematizado mutuamente em nome de um Deus de paz e misericórdia, ofendendo-o com semelhante sacrilégio. O Espiritismo é o laço que um dia os unirá, porque lhes mostrará onde está a verdade, onde o erro” (5).
                 Percebemos o compromisso que o Espiritismo tem com a verdade, de modo que a elucidação sobre trechos bíblicos, quando couber, será sempre do ponto de vista espírita, e não estará necessariamente em concordância com a  teologia católica ou das igrejas evangélicas. É por isto que Kardec, quando escreveu sobre a proibição de Moisés na evocação dos mortos, não se preocupou em fazer um tratado teológico, não porque não entendesse de Bíblia ou de Teologia, mas porque não era necessário. Quem tem de apresentar coerência com a Teologia Cristã são os teólogos de suas respectivas religiões, não o espírita, pois a coerência deste é com a Doutrina Espírita e não com as teologias cristã, judaica ou muçulmana  que, aliás, estão muitos longe  da concordância mútua em inúmeros aspectos. Daí ser-nos suficiente  a resposta de Kardec (6) à proibição de Moisés para quem consulte os mortos.
               A vocação pela verdade e o fato de o conhecimento espírita ter implicações ou desdobramentos que tocam grande parte das Ciências (7) levam naturalmente à compreensão espírita dos textos sagrados. Por isto, expor (8) o ponto de vista espírita, em concordância ou não com as interpretações teológicas, não é nenhum tipo de intromissão, muito ao contrário, é uma responsabilidade dos espíritas. Um louvável exemplo: temos hoje uma tradução do Novo Testamento realizada por um espírita (9). Outro: o esforço para tentar libertar as palavras hebraicas ou gregas dos seus significados teológicos tradicionais (10), adequando-as à compreensão espírita do mundo.
              A oposição ferrenha dos religiosos quando o assunto é comunicação mediúnica pode ocultar também o medo daquilo que os mortos poderiam revelar. Por exemplo, se eles começarem a falar de um Deus que não condena ninguém ao sofrimento por toda a eternidade? E se eles começarem a revelar que seremos julgados pela quantidade de amor que dermos ao nosso semelhante e não pelo nome do Deus que professamos na Terra? E se eles afirmarem que o diabo não existe e que o mal tem origem nas nossas imperfeições? E se revelarem que a Bíblia tem, sim, muitas verdades, mas os homens as distorceram em muitos pontos ou mesmo nunca a compreenderam em seu verdadeiro sentido? E se os espíritos falarem da reencarnação? E se assegurarem que Jesus é um ser cheio de glória, porém não é Deus? E se os mortos começarem a falar de um mundo espiritual, levando as pessoas a repensarem a sua fé? É assim que, para alguns, o melhor mesmo é que os mortos fiquem calados. Todavia, calar os espíritos é como desejar que as aves parem de cantar. Que o sol não nasça pela manhã. Que as flores nunca desabrochem ou ainda que as estrelas parem de brilhar. E da mesma maneira os espíritos, pertencendo irremediavelmente à realidade, não podem ser ignorados ou ocultados para sempre. Ainda bem...

(1) e (2) Evangelho Segundo o Espiritismo, Introdução, Autoridade da Doutrina Espírita em Controle Universal do Ensino dos Espíritos.
(3)Livro dos Espíritos, Conclusão, item XVIII.
(4)Evangelho Segundo o Espiritismo, Prefácio.
(5)Livro dos Espíritos, Conclusão, item IX.
(6) No livro O que é o Espiritismo em Pequena Conferência Espírita, Kardec escreveu: “A proibição feita por Moisés tinha então a sua razão de ser, porque o legislador hebreu queria que o seu povo rompesse com todos os hábitos trazidos do Egito, e de entre os quais o de que tratamos era objeto de abusos. Não se evocavam  então os mortos pelo respeito e afeição tributados a eles, nem com o sentimento de piedade, mas, sim, como meio de adivinhar, como objeto de tráfico vergonhoso, explorado pelo charlatanismo e pela superstição; nessas condições, Moisés teve razão de proibi-lo. (...). Mais adiante Kardec continua: “Hoje as circunstâncias são outras, e a proibição de Moisés já não tem razão de ser”. Além disso, se a Igreja proíbe a evocação dos Espíritos, poderá também impedir que eles venham sem ser chamados?”.
(7) No livro A Gênese, Capítulo I, Caráter da Revelação Espírita, item 18 encontramos: “O Espiritismo, tendo por objeto o estudo de um dos elementos constitutivos do Universo, toca forçosamente na maior parte das ciências”. É assim que, o estudo através do Espiritismo do elemento espiritual, pode influenciar o conhecimento acadêmico em diversas áreas. Por exemplo, a noção que o homem é um ser espiritual que evolui trazendo tendências de vidas passadas faz que historiadores espíritas não aceitem mais ideologias materialistas como as únicas capazes de explicar na sua totalidade, os acontecimentos históricos.
(8) A exposição das ideias espíritas quando o momento ou as circunstâncias forem favoráveis deve ser sempre com atitude respeitosa, lembrando que nem todos vão concordar conosco.
(9) Novo Testamento traduzido por Haroldo Dutra Dias.
(10) No livro Analisando as Traduções Bíblicas de Severino Celestino da Silva.
 

Fausto Fabiano da Silva
faustofabianodasilva@yahoo.com.br

BIBLIOGRAFIA
KARDEC, Allan. Evangelho Segundo o Espiritismo. 85. ed. Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1982.
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 67. ed. São Paulo: Ed. Lake, 2007.
KARDEC, Allan. O que é o Espiritismo. Araras: Ed. Instituto de Difusão Espírita.
KARDEC, Allan. A Gênese. 1ed. Rio de Janeiro: Ed. León Denis, 2008.
O Novo Testamento. Tradução de Haroldo Dutra Dias. 1. ed. Brasília: Ed. FEB, 2013.
SILVA, Severino Celestino. Analisando as Traduções Bíblicas. 6. ed. João Pessoa: Ed. Ideia, 2009.
BÍBLIA. Eclesiastes. Português. Bíblia de Estudo: Aplicação Pessoal. Tradução de João Ferreira de Almeida. Edição rev. e corrigida. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus, 2003.


domingo, 23 de agosto de 2015


                                   DO MATERIALISMO À CRENÇA NOS ESPÍRITOS

                                             Publicado na RIE em abril de 2015

                  Na Revista Espírita de Fevereiro de 1869 em “Um Espírito que julga sonhar” temos um caso curioso de comunicação mediúnica: um espírito que acredita estar ainda no corpo físico, mesmo tendo já desencarnado. Exemplos assim, não são incomuns, mas o que nos chama atenção neste caso, é a dificuldade do espírito em aceitar a sua nova situação, tanto é assim que acreditava estar vivendo um sonho, que logo despertaria outra vez para a vida material, a única forma que seria a verdadeira no seu entendimento.  Em certo momento tentaram persuadi-lo perguntando: “Onde está o vosso verdadeiro corpo? Não está aqui, pois não estais em vossa casa. Quando se sonha, está-se em seu leito. Ide, pois, ver em vosso leito se o vosso corpo lá está e dizei-nos como podeis estar aqui sem o vosso corpo? Perdendo a paciência por estas reiteradas perguntas, às quais apenas respondia pelas palavras: Efeitos bizarros dos sonhos...”. Nós sabemos que existem pessoas que não acreditariam mesmo que vissem (1), mas através da análise deste caso da Revista Espírita, nós entendemos que pode existir por certo tempo, pessoas tão presas a suas próprias convicções que não acreditariam em espíritos mesmo que elas próprias já estivessem no plano espiritual. É interessante a opinião do Espírito Erasto sobre o materialismo entre os espíritos, encontrada na Revista Espírita de maio de 1863 em “Questões e Problemas”: “Uma das condições de sua cegueira moral é de aprisionar mais violentamente nos laços da materialidade e, conseguintemente, de os impedir que se afastem das regiões terrestres ou similares à Terra. E, assim como a maioria dos desencarnados, cativos na carne, não pode perceber as formas vaporosas dos Espíritos que os cercam, também a opacidade do envoltório dos materialistas lhes impede a contemplação das entidades espirituais que se movem, tão belas e tão radiosas, nas altas esferas do império celeste”.
                  O que podemos aprender é que o apego pode ser extremo a determinadas visões de mundo, no caso, o ponto de vista materialista, onde os espíritos não podem existir de jeito nenhum. Se a crença nos espíritos é incômoda para alguns indivíduos, pasmem, mesmo após o desencarne, o que se dirá para eles durante a vida terrena. Isto revela a necessidade de inúmeras reencarnações para o espírito ou mesmo para populações inteiras até que se tornem mais simpáticos as concepções espiritualistas, porque o materialismo tem ainda a sua força de convencimento, entretanto, a crença nos espíritos faz parte de uma determinação maior chamada Lei do Progresso, são esclarecedoras as palavras de Kardec: “O homem não pode conservar-se indefinidamente na ignorância, porque tem de atingir a finalidade que a Providência lhe assinou. Ele se instrui pela força das coisas. As revoluções morais, como as revoluções sociais, se infiltram nas ideias pouco a pouco; germinam durante séculos; depois, irrompem subitamente e produzem o desmoronamento do carunchoso edifício do passado, que deixou de estar em harmonia com as necessidades novas e com as novas aspirações” (2).
                  Nota-se então que os acolhimentos de ideias progressistas, abrangidas aí à crença nos espíritos, estão todas incluídas num longo processo histórico onde a reencarnação toma papel fundamental por que através das reencarnações modificam-se as mentalidades.  Engana-se quem pensa que este processo não acontecerá, digo mesmo que já está acontecendo. O paradigma materialista, por exemplo, está enfraquecido com o próprio desenvolvimento da Ciência como nos mostra o Filósofo Nicola Abbgnano:  “o materialismo da metade do séc. XIX tem caráter romântico, pois não se limita a ser uma tese filosófica dotada de maiores ou menores possibilidades de confirmação, mas pretende ser doutrina de vida, destinada a vencer a religião e a suplantá-la. Essa pretensão confere a tais doutrinas um tom violentamente polêmico e profético, transformado a "Ciência" na nova tábua da verdade absoluta. Essa atitude recebeu o nome de cientificismo e constitui a vanguarda romântica da ciência do séc. XIX; o materialismo foi seu credo. Mas esse credo foi em parte destruído pela própria ciência, em virtude da crise de sua concepção mecanicista nos últimos decênios do séc. XIX”. Hoje a Física atual dá mais um golpe contra a concepção materialista quando afirma que  o Universo visível ou normal  é uma pequenina parte (cerca de 4 ou 5 %) de outro, invisível, composto basicamente por matéria e energia escura (3),  é útil lembrarmos a questão 22 do Livro dos Espíritos: “Mas a matéria existe em estados que ignorais. Pode ser, por exemplo, tão etérea e sutil, que nenhuma impressão vos cause aos sentidos”. Outro exemplo, do enfraquecimento materialista, são os estudos da sobrevivência da alma nos meios acadêmicos, deslocando a questão para fora do âmbito religioso ou do espaço exclusivo da fé. Um exemplo desta pesquisa, entre outras semelhantes, saiu recentemente na imprensa: Cientistas e pesquisadores holandeses publicaram estudo no qual revelam que nossas almas podem abandonar nossos corpos e observá-los. Foram mais de 70 casos estudados com pessoas que relataram experiências durante o período em que estiveram clinicamente mortas. O caso mais impressionante relatado pela pesquisa é de um paciente clinicamente morto por 20 minutos durante uma cirurgia cardíaca. Se sua volta à vida surpreendeu médicos, estes ficaram ainda mais perplexos quando ele descreveu que “saiu de seu corpo” e soube indicar precisamente a posição em que cada um dos médicos durante o período em que estava morto, além de fatos relevantes que aconteceram na sala”.
                  A aceitação da existência dos espíritos compreendidos como homens e mulheres desencarnados é um processo irreversível, porque os espíritos “constituem uma das potências da Natureza” (4) e são parte da realidade quer gostemos ou não.  É claro que, no processo da aceitação da sobrevivência da alma conforme a compreensão espírita, os opositores materialistas tentarão a todo custo, e enquanto for possível, entender a alma e suas manifestações como simples reações neurológicas. Mas os adversários não se encontrarão somente entre os materialistas, mas também no meio dos religiosos que defenderão as manifestações espíritas como maquinações do diabo, engodo, entre outras causas, mesmo as mais extravagantes, desde que seja afastada a tese espírita. Reflitamos, portanto, que o Espiritismo ainda terá uma longa trajetória pela frente, onde as ideias não espíritas procurarão se manter vivas a quem as tenham por fé religiosa, convicções materialistas ou por outras influências;  mas isto é compreensível, diante da  dificuldade em abandonar crenças religiosas ou não, profundamente enraizadas, ou quando o orgulho dificulte a mudança de opinião.
                  No longo processo de difusão do pensamento espírita os escolhos virão então por vários lados e se apresentarão de várias maneiras, de forma que os espíritas devem estar preparados.  Sobre isto é útil lembrar o que foi dito a Kardec, palavras encontradas em Obras Póstumas em “Minha Missão”: “Suscitarás contra ti ódios terríveis; inimigos encarniçados se conjurarão para tua perda; ver-te-ás a braços com a malevolência, com a calúnia, com a traição mesma dos que te parecerão os mais dedicados; as tuas melhores instruções serão desprezadas e falseadas...” Devemos ponderar em que medida estas palavras também dizem respeito a todos os espíritas. Professar ideias de vanguarda num mundo apegado a antigas tradições tem seu preço: preconceito, ironia, desconfiança e incompreensão, mas estejamos certos que esta fase passará, e até lá, podemos sim, reclamar o devido respeito por nossas ideias, mas não podemos exigir dos outros a compreensão do mundo que não possuem.
                  Para aqueles que têm fé verdadeira em Deus e nos postulados espíritas, a crença nos espíritos bem como a certeza da imortalidade, da reencarnação, da comunicação mediúnica e da justiça Divina se tornarão gerais, não importa o tempo que passe. Neste longo caminho, cada espírita é chamado a um propósito maior: “É chegada a hora em que deveis sacrificar à sua propagação os vossos hábitos, os vossos trabalhos, as vossas ocupações fúteis. Ide e pregai” (5), no entanto nem todos os espíritas permanecerão no caminho: mas, atenção! entre os chamados para o Espiritismo muitos se transviaram; reparai, pois, vosso caminho e segui a verdade” (6), porém, “ditosos serão os que houverem trabalhado no campo do Senhor, com desinteresse e sem outro móvel, senão a caridade! Seus dias de trabalho serão pagos pelo cêntuplo do que tiverem esperado” (7).



(1) Questão 802 do Livro dos Espíritos
(2) Questão 783 do Livro dos Espíritos
(3)Esse mundo faz parte do nosso sistema planetário? R– Sim; está muito próximo de vós. Entretanto, não podeis vê-lo, porque não tem luz própria e não recebe nem reflete a luz dos sóis que o rodeiam”. Segundo os cientistas, a matéria escura tem este nome porque não reflete e nem absorve a luz, será então o que o mundo descrito pelo espírito Alexandre de Humboldt em Conversas Familiares de Além-Túmulo na Revista Espírita de junho de 1859, é feito de matéria ou energia escura? Ou a matéria/energia escuras já são elementos do plano espiritual? Somente o futuro dirá.
(4) Introdução e questão 87 do Livro dos Espíritos
(5) e (6) Evangelho Segundo o Espiritismo em Missão dos Espíritas
(7) Evangelho Segundo o Espiritismo em Os Obreiros do Senhor




FAUSTO FABIANO DA SILVA


BIBLIOGRAFIA

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KARDEC, Allan. Revista Espírita. Fevereiro de 1869, Araras: Ed. IDE, 2001.
KARDEC, Allan. Revista Espírita. Maio de 1863, Araras: Ed. IDE, 2000.
KARDEC, Allan. Revista Espírita. Junho de 1859, Araras: Ed. IDE, 2001.
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 67 ed. São Paulo: Ed. Lake, 2007.
KARDEC, Allan. Evangelho Segundo o Espiritismo. 85. ed. Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1982.
KARDEC, Allan. Obras Póstumas. 19 ed. São Paulo: Ide, 2004.
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 5. ed. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 2007.







































JESUS, O MAIS PERFEITO MODELO.

                                                  Publicado na RIE de agosto de 2015               
                                   
                  Para a Doutrina Espírita, Jesus é o mais perfeito modelo para a humanidade terrestre (1) e por este motivo a presença deste espírito nas Letras da Codificação é obrigatória, não se tratando, a sua menção, de uma política de boa vizinhança com o Catolicismo do século XIX (2), escolha natural em um mundo cristão ou fruto da mentalidade cristã em Kardec ou nos Espíritos. Mas qual a base doutrinária para concluirmos que Jesus é o mais evoluído espírito que já encarnou? Modelo e guia pra toda a humanidade e por isto tão presente na Doutrina Espírita?
                Vamos começar com o pensamento do próprio Allan Kardec, que escreveu nos comentários a questão 625 do Livro dos Espíritos: “Para o homem, Jesus constitui o tipo da perfeição moral a que a Humanidade pode aspirar na Terra. Deus no-lo oferece como o mais perfeito modelo (...) sendo ele o mais puro de quantos têm aparecido na Terra, o Espírito Divino o animava”.   E no Livro A Gênese, publicado em 1868 encontramos no capítulo XI: É igualmente com o objetivo de fazer que a Humanidade se adiante em determinado sentido que Espíritos superiores, embora sem as qualidades do Cristo, encarnam de tempos a tempos na Terra...”. Observamos que o primeiro trecho mostra de maneira clara que Kardec entendia Jesus como o mais evoluído espírito que já encarnou na Terra e no segundo trecho de 1868, tornar-se visível a continuidade deste pensamento mesmo passados mais de uma década do lançamento do Livro dos Espíritos. Mas porque razão Kardec pensava desta maneira? Três pensamentos do Codificador revelam a resposta a esta indagação, o primeiro pensamento diz respeito as faculdade ou poderes de Jesus para efetuar seus conhecidos prodígios: “De todas as faculdades que Jesus revelou, nenhuma se pode apontar estranha às condições da humanidade e que se não encontre comumente nos homens, porque estão todas na ordem da Natureza. Pela superioridade, porém, da sua essência moral e de suas qualidades fluídicas, aquelas faculdades atingiam nele proporções muito acima das que são vulgares”(3), a segunda reflexão faz referência à autoridade moral de Jesus para expulsar os espíritos inferiores:  “A subjugação corporal tira muitas vezes ao obsidiado a energia necessária para dominar o mau Espírito. Daí o tornar-se precisa a intervenção de um terceiro, que atue, ou pelo magnetismo, ou pelo império da sua vontade. Em falta do concurso do obsidiado, essa terceira pessoa deve tomar ascendente sobre o Espírito; porém, como este ascendente só pode ser moral, só a um ser moralmente superior ao Espírito é dado assumi-lo e seu poder será tanto maior, quanto maior for a sua superioridade moral, porque, então, se impõe àquele, que se vê forçado a inclinar-se diante dele. Por isso é que Jesus tinha tão grande poder para expulsar o a que naquela época se chamava demônio, isto é, os maus Espíritos obsessores” (4), e o terceiro pensamento sobre a influência moralizadora de Jesus: “Pelos imensos resultados que produziu, a sua encarnação neste mundo forçosamente há de ter sido uma dessas missões que a Divindade somente a seus mensageiros diretos confia, para cumprimento de seus desígnios”(5).
                    Se já não bastasse a lógica do raciocínio de Allan Kardec, para dar embasamento à crença na imensa superioridade de Jesus e tê-lo como modelo para a humanidade, ainda temos, a opinião dos próprios Espíritos, que sem dúvida trilham o mesmo caminho: “Um dia, Deus, em sua inesgotável caridade, permitiu que o homem visse a verdade varar as trevas. Esse dia foi o do advento do Cristo” (6), “O Cristo foi o iniciador da mais pura, da mais sublime moral, da moral evangélico-cristã, que há de renovar o mundo, aproximar os homens e torná-los irmãos” (7); “Irmãos! nada perece. Jesus - Cristo é o vencedor do mal...” (8).  “todos quantos praticam a caridade são discípulos de Jesus...” (9).  “Estamos incumbidos de preparar o reino do bem que Jesus anunciou” (10).  Percebemos pela maneira como os Espíritos falam de Jesus, a autoridade deste espírito, o grau de abrangência de sua mensagem e o significado de sua encarnação, por isto, sua figura se impõe na conjuntura da História terrena, em consequência, não poderia estar ausente na Doutrina Espírita. Como se vê, o comentário de Kardec à questão 625 do Livro dos Espíritos, citada no início do texto, faz todo sentido.
                  O pensamento de Kardec e dos Espíritos em relação a Jesus estão corretos também, por uma característica do Espiritismo, que é tratar de problemáticas gerais, ou ter princípios universais (11). Esta vocação, de abranger toda a realidade do mundo, não poderia ser diferente quanto à moralidade. Desta maneira, os Espíritos ao conjecturarem sobre as Leis Divinas (12), escolheriam como referência, uma moral também abrangente, que incluísse toda a realidade e não somente o mundo ocidental, e apenas a moral de um espírito mais iluminado, com mais autoridade que os outros (13), teria esta natureza. Vale lembrar o pensamento de Kardec: Em muitas circunstâncias, prova Jesus que suas vistas não se circunscrevem ao povo judeu, mas que abrangem a Humanidade toda” (14). Já dá para notar, como é equivocada a tese, por exemplo, que os Espíritos da Codificação, teriam citado Cristo, somente porque estes mesmos espíritos apresentariam a mente embebida no Cristianismo de suas reencarnações terrenas. Acreditar nisto é como um observador, que olha um grande lago e vê a apenas sua superfície, e tira por isto conclusões erradas, ignora, ou quer ignorar o que as profundezas poderiam lhe fazer conhecer.
                   Por fim, todos os espíritas devem lembrar-se da passagem do livro A Gênese de Kardec, onde está escrito: “Numa palavra, o que caracteriza a revelação espírita é o ser divina a sua origem e da iniciativa dos Espíritos, sendo a sua elaboração fruto do trabalho do homem” (15). Ora, no Espiritismo, Deus é a inteligência suprema (16), e o Espiritismo veio ao mundo, em última análise, pelas Suas mãos, já que é divina a sua origem, então, é bem razoável supor, que a Doutrina Espírita não tenha aparecido por acaso no Mundo Ocidental, mas por um propósito maior. Que propósito será este, além da melhoria da humanidade, senão confirmar como, verdadeiras e gerais, as duas tradições culturais do Ocidente, o monoteísmo e a moral de Jesus? Também podemos argumentar que o Espiritismo já estava nos planos de Deus muito antes de Kardec nascer, portanto não é Ocidental nem Oriental, mas divino na sua essência, por isto compactua com a verdade (17) com aquilo que é melhor, mais justo, mais evoluído e mais abrangente. Então é absurda também, a tese onde Jesus é o mais evoluído somente para agradar a sociedade europeia da época. Tese como esta, só pode ter sentido para não espíritas, ou para espíritas que nunca compreenderam verdadeiramente o Espiritismo. Entretanto, entender Jesus como o mais perfeito modelo, como Kardec pensava, está completamente dentro da lógica Doutrinária e não há razão para abandonarmos esta tradicional convicção por outras interpretações.
                    Devemos aprender que o tradicional não será necessariamente ultrapassado por ser tradicional e que o novo não será verdadeiro somente por que é novo. Muitas vezes, opiniões pessoais com pouca ou nenhuma fundamentação real tentam se legitimar atrás de palavras como “nova visão” disto ou daquilo. Raciocínios falsos tentam ganhar ares de verdade vestidos pelo vocabulário erudito. Autores comprometidos mais com seu próprio prestígio pessoal do que pela Doutrina lançam teses duvidosas. Não pretendemos com estas observações execrar o novo, e deixar de lado as contribuições que podem nos trazer os estudiosos e pesquisadores da Doutrina Espírita, porém, devemos dar credibilidade as críticas a qualquer visão tradicional, somente se estiverem com melhores, mais fortes e mais profundos argumentos, com poder de mostrar o erro (18) e revelar novos caminhos a seguir.

(1) No Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo III em Destinação da Terra. Causas das Misérias Terrenas está escrito: “Deve-se considerar que na Terra não está a Humanidade toda, mas apenas uma pequena fração da Humanidade. Com efeito, a espécie humana abrange todos os seres dotados de razão que povoam os inúmeros orbes do Universo”. O que nos leva a crer em encarnações missionárias nestes planetas, análogas a do Cristo, por outros espíritos de grande evolução espiritual.
(2) O Espiritismo nasceu oficialmente no século XIX em 18  de abril de 1857 com a publicação da primeira edição do Livro dos Espíritos.
(3) Livro A Gênese de Kardec, capítulo XV, Os Milagres do Evangelho, item transfiguração.
(4) Livro dos Médiuns de Kardec, capítulo XXIII, Da Obsessão, item 251.
(5) Livro A Gênese de Kardec, capítulo XV, Os Milagres do Evangelho em Superioridade da Natureza de Jesus.
(6) e (7) Espírito Fénelon, e Um Espírito israelita, respectivamente no Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo primeiro, Não Vim Destruir a Lei em Instruções dos Espíritos.
(8) Espírito de Verdade, Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo VI, O Cristo Consolador.
(9) Espírito Paulo o apóstolo, Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo XV, Instruções dos Espíritos.
(10) Resposta dos Espíritos à questão 627 do Livro dos Espíritos.
(11) A Lei do Progresso analisada na Parte Terceira, capítulo VIII do Livro dos Espíritos, é um exemplo.
(12) Livro dos Espíritos, Terceira Parte, Capítulo I, Da Lei Divina ou Natural.
(13) Quanto mais evoluído é o espírito mais autoridade tem ele sobre os outros. Em consequência mais verdadeira e abrangente é sua mensagem. No Livro dos Espíritos está escrito: “Os Espíritos têm uns sobre os outros a autoridade correspondente ao grau de superioridade que hajam alcançado, autoridade que eles exercem por um ascendente moral irresistível”.
(14) Livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo XXIV, Não ponhais a candeia debaixo do alqueire, item nove.
(15) Livro A Gênese, Capítulo I, Caráter da Revelação Espírita, item 13.
(16) Na primeira pergunta do Livro dos Espíritos a resposta dos Espíritos: “Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”.
(17) No prefácio do Evangelho Segundo o Espiritismo as palavras do Espírito de Verdade: “Eu vos digo, em verdade, que são chegados os tempos em que todas as coisas hão de ser restabelecidas no seu verdadeiro sentido, para dissipar as trevas, confundir os orgulhosos e glorificar os justos”.
(18) Livro A Gênese de Kardec no capítulo Caráter da Revelação Espírita, item 55, Kardec escreve: “Caminhando de par com o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará”.

FAUSTO FABIANO DA SILVA

BIBLIOGRAFIA

KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 67. ed. São Paulo: Ed.  Lake, 2007.
KARDEC, Allan. A Gênese. 1ed. Rio de Janeiro: Ed. León Denis, 2008.
KARDEC, Allan. Evangelho Segundo o Espiritismo. 85. ed. Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1982.