Uma Conversa em Particular
(publicada no jornal espírita O Clarim de abril de 2019)
Em rua de um bairro de periferia, um pequeno
caminhão carregava nossa mudança. Eram
pertences comuns a todas as famílias: estrado de cama, fogão, geladeira, sofá,
entre outras coisas. Ao chegarmos, descemos do caminhão, fomos abrir as portas
da nova casa, porém, o motorista, aproveitando-se de nossa ausência, ligou o
motor e foi embora, com tudo que era nosso. De uma hora para outra ficamos sem
nada. Uma casa vazia, e as roupas do corpo.
Tive este sonho há muitos
anos atrás. Percebo hoje, que era um aviso da espiritualidade, para as coisas
que estariam por vir. Para que me preparasse, para que não me revoltasse. Não
há dúvida que era um sonho que indicaria uma grande prova, uma dificuldade que
teria inevitavelmente que trilhar (01). Alguns anos se passaram, e tive outro
sonho. Agora, eu e minha esposa estávamos numa floresta quando avistamos uma
grande clareira iluminada pelo sol, ao tentarmos adentrar na clareira, notamos
que havia apenas um caminho, completamente cheio de espinhos. Linguagem
simbólica mais clara que isto impossível.
Em outra ocasião tive um sonho que alguém me dizia segurando minha mão:
não ponha tua felicidade nas coisas materiais, então eu caia em pranto. Sabem
de uma coisa? O meu coração diz que não foi só um sonho, foi um recado, outra
vez um aviso (02).
Mas não pensem que a espiritualidade se
manifestou apenas em sonhos. Os espíritos do bem, os espíritos protetores,
podem usar diversos canais de comunicação.
Foi assim que, certa vez, foram orar em minha casa amigos que são
evangélicos e um deles discretamente me disse: não se desespere. Na hora não
entendi, achei exagerada a colocação, mas hoje penso diferente, pois tive
várias ocasiões para entrar em desespero.
Foram muitos outros avisos e recados,
certamente muito mais do que merecia. E a grande prova finalmente chegou. Por conta disto, por algum tempo, me tornei um
jogador de loterias compulsivo, tentando eu mesmo, tirar minha família da
situação difícil que se encontrava. Mas nunca tive qualquer êxito. A idéia de
depender exclusivamente de Deus me assustava muito. Mas digo, às vezes, é isso
que vai acontecer. Há problemas do ponto de vista humano, de difícil solução.
Não haverá para onde correr, ninguém para ajudar naquele momento. Apenas Deus e
seus mensageiros. Apenas restará se resignar à vontade do Pai.
Mas o que me chama atenção em todos estes
avisos é que não estamos sozinhos. Nossa vida está sendo acompanhada pela espiritualidade,
e é bom saber disto, porque algumas vezes, acreditamos estar completamente
esquecidos. (03)
Mais uma prova deste acompanhamento amoroso e
sutil, por parte dos espíritos do bem, foi, com bastante antecedência, me
alertar sobre os perigos do suicídio. Com frequência caía em minhas mãos
mensagens espíritas sobre este tema. Pensava
ser uma coincidência, que isto não tinha relação comigo. Estava enganado, pois,
no futuro, esta idéia iria passar, sim, pela minha cabeça. Em certa ocasião,
tentei até elaborar uma estratégia racional pra justificar tal ato. Pensei, se
eu tirar a própria vida, meus filhos não terão mais que conviver com o pai
fracassado que eu tinha me tornado. Contudo, imediatamente começava a imaginar
as provas ainda mais difíceis em outras reencarnações (04) a dor que minha
ausência iria ocasionar em meus filhos, em minha esposa. Então, afastava com
todas as minhas forças tais idéias. Ainda bem.
Não é fácil falar sobre isto.
Confessar que nem sempre somos fortes. Haverá julgamentos, os outros nos
olharão nem sempre com compreensão. Alguns dirão: é culpa do Espiritismo que
você abraçou, se você fosse evangélico não estaria passando por isto, se fosse
católico também não. Outros ainda, agirão com indiferença ou desprezo.
Sempre li livros espíritas,
principalmente na adolescência. Ficava admirado com as grandes superações
morais, com as descrições de espíritos iluminados que em prece irradiavam luz
de várias formas, sonhava com mundos mais evoluídos que um dia poderia frequentar.
A evolução, aberta para todos, me indicava que inclusive eu, tão imperfeito,
também poderia estar entre aqueles espíritos, um dia. No entanto, esta fé,
acredito, teria que criar raízes mais profundas, ser regada pelas minhas
próprias lágrimas, crescer pela experiência real com Deus. E como isto é
difícil, porém não é impossível.
Este texto é um exemplo
disto. Penso nada poder fazer agora para resolver meus problemas. Estou com as
mãos atadas. Os caminhos foram inteiramente fechados. Então o que vou fazer? Esperar
em Deus e orar. Mas o que mais? Poderei escrever um texto narrando o que estou
passado, um texto inspirador que reconforte talvez outras vidas. Então, se frustraram aqueles desencarnados ou
encarnados que esperavam minha queda certa. Frustrou-se meu lado sombrio que
ameaçava se estabelecer em meu ser. E saíram vitoriosos, caro leitor, antigos
sonhos de adolescência onde o bem e o amor sempre acabam vencendo no final...
01- Alguns pensam que não podem intervir nas provas do
próximo com a justificativa de, caso o fizessem, iriam atrapalhar o
planejamento reencarnatório alheio, mas isto é um equívoco. No Evangelho
Segundo o Espiritismo, Capítulo V em Dever-se-á por termo às provas do próximo
encontramos: “Sabeis se a
Providência não vos escolheu, não como instrumento de suplício para agravar os
sofrimentos do culpado, mas como o bálsamo da consolação para fazer cicatrizar
as chagas que a sua justiça abrira?”.
02- Na questão 402 do Livro dos Espíritos encontramos: “Graças ao sono, os espíritos encarnados
estão sempre em relação com o mundo dos espíritos”.
03- Na questão 495 do Livro dos Espíritos encontramos: “Nem nos cárceres, nem nos hospitais, nem
nos lugares de devassidão, nem na solidão, estais separados desses amigos a
quem não podeis ver, mas cujo brando influxo vossa alma sente, ao mesmo tempo
que lhes ouve os ponderados conselhos”.
04- Na questão 957 do Livro dos Espíritos encontramos: “Muito diversas são as conseqüências do
suicídio. Não há penas determinadas e, em todos os casos, correspondem sempre
às causas que o produziram. Há, porém, uma conseqüência a que o suicida não
pode escapar; é o desapontamento.
Mas, a sorte não é a mesma para todos; depende das circunstâncias. Alguns
expiam a falta imediatamente, outros em nova existência, que será pior do que
aquela cujo curso interromperam.”
FAUSTO
FABIANO DA SILVA
BIBLIOGRAFIA
KARDEC, Allan. O Livro
dos Espíritos. 67. ed. São Paulo: Ed. Lake, 2007.
KARDEC, Allan. Evangelho
Segundo o Espiritismo. 85. ed. Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1982.
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